sexta-feira, 25 de novembro de 2011

Afinal, o caminhante solitário é um pessimista ou um otimista?

                                                                                                                                            Em 19.11.2011
    Bom, já faz um tempinho que não escrevo sobre os livros que tenho lido. Não que não os tenha achado interessantes ou dignos de nota, mas simplesmente por ter emendado um no outro enquanto várias ideias e tarefas foram surgindo ao mesmo tempo. Essa semana, porém, terminei de ler os Devaneios do Caminhante Solitário - Rousseau, cuja leitura iniciei durante as últimas férias. Foi uma leitura onde fiz questão de, fugindo a regra, não fazer de forma dinâmica. Pelo contrário: lia e relia parágrafos, não sei ainda se para melhor fixá-los ou devido ao embasbacamento que me causaram. Nunca tinha lido Rousseau e, como todo e qualquer tema que trate da solidão humana, minha atenção foi despertada. “Apesar de talvez ser o único no mundo cujo destino fez disso uma lei, não posso acreditar ser o único a ter um gosto tão natural, embora até o momento não o tenha encontrado em mais ninguém.” Ah, meu caro Rousseau... Como queria ter lhe conhecido!
    Foi um de seus últimos livros, restando inacabado. Em tais escritos, ele faz um balanço de sua vida, descreve seu amor pela botânica, pela contemplação da natureza e pela solidão. Registra seus devaneios e relata as injustiças das quais se julgara vítima. Descreve seus sentimentos no fim da vida. A percepção da iminência do fim, a consciência vívida em contraste com a falência e fraqueza do corpo e sua resignação frente a tudo isso. Descrições que me comoveram, e as lágrimas somente não rolaram porque a descrição final, inacabada, deixa a mente surpresa, vaga e os ausentes parágrafos finais a serem digeridos ao sabor de cada leitor.
    Um dos pontos que mais me tem feito refletir é aquele onde Rousseau diz acreditar que não é possível permanecermos nesse estado de completude de forma permanente. A regra não é a felicidade, mas os momentos de alegria? Por que não pode ser o contrário?
    “A felicidade é um estado permanente que não parece feito para o homem nesse mundo. Tudo na terra está em fluxo contínuo que não permite a nada assumir uma forma constante. Tudo muda à nossa volta. Nós mesmos mudamos, e ninguém pode garantir que amará amanhã aquilo que ama hoje. Assim, todos os nossos projetos de felicidade nessa vida são ilusões. Aproveitemos o contentamento do espírito enquanto ocorre: evitemos afastá-lo por erro nosso, mas não façamos projetos para acorrentá-lo, pois tais projetos são pura tolice. Vi poucos homens felizes, talvez nenhum, mas muitas vezes vi corações contentes, e de todos os objetos que me marcaram este é o que por minha vez mais me contentou. Creio que se trata de uma decorrência natural do poder das sensações sobre meus sentimentos internos. A felicidade não apresenta sinais externos; para conhecê-la seria preciso ler o coração do homem feliz; porém, o contentamento pode ser lido nos olhos, na postura, no tom, no andar, e parece ser comunicado àquele que o percebe. Haverá prazer mais doce que ver um povo inteiro se entregar à alegria em dias de festa e todos os corações se iluminarem aos raios expansivos do prazer que passa de maneira rápida, mas intensa, pelas nuvens da vida?”
    Eu acho que é uma daquelas leituras que nos fazem dar mais valor a saúde, a juventude e à lucidez. E é isso que tento fazer todas as vezes em que saio por aí, durante minhas caminhadas, corridas, a pé ou de bicicleta e que me faz querer mais: quero aprender slackline, andar de patins, viajar, conhecer o mundo, ler e escrever. Quero ouvir mais música, dançar, melhorar nos snujs e, quem sabe, aprender a tocar violão. Ver, ouvir e sentir a natureza, voltar para a ioga e aprender as técnicas de meditação. Quero estudar, tirar da minha inteligência tudo o que ela puder me dar e ouvir todas as aulas de filosofia que se dispuserem a me ensinar. E olha que a cada uma delas me convenço de que há muito mais por vir! Frase clichê do filósofo: só sei que nada sei. Mas isso não me desanima. Ao contrário, só me incentiva.
    Não sei, pode ser um pouquinho de melancolia, ainda sob o efeito catártico da leitura, desse reconhecimento da inevitabilidade do fim. Li em algum lugar que o ser humano é o único capaz de ter consciência da sua finitude. Ainda estou convencida de que a ignorância é uma benção, mas talvez, como toda e qualquer regra, também essa tenha uma exceção. Já que não tem jeito, vou vivendo tudo que me aparecer, da melhor forma que puder, o que não quer dizer com pressa, mas com intensidade. Fazendo tudo o que quero e posso, desde que não prejudique ninguém.
    E foi assim que passei esta semana. As pessoas na rua, será que me julgaram maluca? Pois sim, andei rindo pelas avenidas, dei gargalhadas na aula, tive que morder os lábios para não rir para estranhos, exceto para uma garotinha que veio me cumprimentar com um sonoro “Oiiii” e não pude resistir (aliás, dei graças a deus por não precisar fazê-lo).
    Contemplei um mar tão azul, tal qual nunca antes em meus 29 anos carioca-praianos; perdi a conta de quantos cachorros, pássaros; corri com pingos de chuva e simultâneos raios de sol no rosto; assisti a um ótimo filme e ouvi músicas melhores ainda.
    Vamos lá: o que é capaz de fazer uma pessoa sentir-se assim? Duas dicas: caso seja um homem, não se trata da vitória do seu time. Caso seja uma mulher, não se trata de uma nova paixão.
    E, ainda assim, me lembrei de quando diziam que a pessimista era eu, com minha visão schopenhaueriana de mundo. E eles, falsos moralistas, pseudo-otimistas que, em sua indolência, passam o dia simplesmente sobrevivendo e à noite rezam para a sorte e para o acaso?
    Ah, sim. Leitura atual: Quando Nietzsche Chorou e A cura de Schopenhauer, ambos do mesmo autor. Não vejo a hora de entender afinal qual, dentre otimistas e pessimistas, é o verdadeiro realista.

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